Independentemente do regime em vigor, a política é sempre um jogo injusto. Esta derrota do PS faz lembrar um injustiçado, António José Seguro. Seguro sempre me lembrou aqueles militantes do PS, dos mais antigos, que acreditam piamente que o Estado precisa não só do PS, mas da sua estrutura e organização internas, quase como se o modelo da social-democracia europeia para o país fosse, mais do que a ideologia, a burocracia do Partido Socialista. E assim, depois do furacão Sócrates, Seguro ocupou-se a reconstruir e a olear essa grande máquina partidária que é o PS. Foi especialmente castigado pela juventude do seu partido, coio de ambições desmedidas, que se deixou levar pelo carisma de Costa. Mesmo assim, exilado pelo partido que procurou ressuscitar, Seguro não foi um foco de dissensão. Até ao fim, foi um homem do partido.
Outra profunda injustiçada, desta vez pelo resultado eleitoral, é a direita portuguesa. O acto eleitoral conheceu uma percentagem de abstenção acima dos 40%. A coligação dos dois partidos de centro-direita do país não conseguiu muito mais do que 37% dos votos. À direita deste resultado, o deserto. Não existe mais direita, para além desta desoladora percentagem, em Portugal. Uma direita que só existe pela necessidade suscitada no eleitorado de "pôr as contas em ordem". O CDS vê-se dissolvido, por esta vitória pírrica, nesse consórcio de Baronatos, Interesses e Companhia Lda. que é o PSD. A importância que tem no seio da coligação, ninguém sabe. Sabe-se que é pouca. Pouca, que o obriga a uma subalternização que levará, possivelmente, à fusão e extinção do único partido de representação parlamentar que se aproxima, ou aproximava, daquilo que é uma direita, no plano económico, cultural, social, histórico. A vitória da coligação marca o primeiro ano oficial da III República em que não existe direita no parlamento português, apenas um centrão tecnocrático, que preencherá a miragem de uma direita neo-liberal fascista que é a riqueza de tanta narrativa esquerdista.
A provar-se a incapacidade da esquerda em se comprometer e coligar - o maior obstáculo é a fome de Estado do Partido Socialista, que está desesperado e não pode dar-se ao luxo de repartir o bolo com ninguém - fica a esta direita a responsabilidade de governar, com pinças. Tem ao seu dispor a ausência de união dos adversários e a possibilidade de explorar as previsíveis dissidências dentro do Partido Socialista. Isto e, claro, o medo da falência do Estado. Basta não ser muito glutão quando chegar a hora de fatiar o Erário Público.