(transcrição em VII partes do artigo publicado n'O Diabo, 27 de Agosto de 2013)
O nome do arcanjo Miguel, padroeiro da Legitimidade, foi despreocupadamente dado ao sétimo filho do príncipe-regente D. João e de sua mulher, a princesa Carlota Joaquina. No entanto, com o passar dos anos, o destino deste jovem infante tornou-se inegavelmente ligado ao conteúdo profético desse mesmo nome. O Calvário da Legitimidade será personificado por este rei português de forma exemplar, equiparando-o aos outros Monarcas Malditos da História Europeia, como Carlos Stuart para os Jacobitas Escoceses, Dom Carlos de Borbón para os Carlistas Espanhóis e o Conde de Chambord para os Legitimistas Franceses.
“Fazei por aplacar um Deus irado
Lembrai-lhe o cumprimento da Promessa.
Que em Ourique vos fez crucificado.”
Soneto evocativo de D. Afonso Henriques aquando da visita de D. Miguel ao túmulo do primeiro rei.
Rei Tradicionalista ou Cruel Usurpador, Dom Miguel posiciona-se na História de Portugal como um dos reis mais controversos, sem dúvida aquele que mais ódios e paixões despertou na nossa complicada Era Contemporânea. Símbolo do Portugal Profundo e Católico que o Liberalismo temeu e hostilizou, a sua figura carismática fez sombra à popularidade dos Reis Constitucionais, privando-os da simpatia do povo na mesma medida em que a tinham gozado dos seus antecessores. Conta-se que aquando da visita de Dom Pedro V ao Santuário de Nossa Senhora da Rocha, imagem que era alvo particular da devoção miguelista, este havia-se cruzado com uma velhinha que lhe dissera que, embora nutrissem todos os locais de muito carinho por esse rei querido, de quem eles sentiam falta era daquele que lhes fora tirado, aquele que se fora embora. A ameaça do ressurgimento miguelista durou muito depois do exílio de Dom Miguel do território nacional, mantendo-se os seus partidários (o Partido Legitimista) em actividade política activa até meados de metade do século XX.