terça-feira, 15 de janeiro de 2013

António Nobre, Só


Imagem – filme “Ala-Arriba” – José Leitão de Barros, 1942.

Georges! anda ver meu país de Marinheiros, 
O meu país das naus, de esquadras e de frotas!

Oh as lanchas dos poveiros 
A saírem a barra, entre ondas de gaivotas! 
Que estranho é! 
Fincam o remo na água, até que o remo torça, 
À espera de maré, 
Que não tarda aí, avista-se lá fora! 
E quando a onda vem, fincando-a com toda a força, 
Clamam todas à uma: "Agôra! agôra! agôra!" 
E, a pouco e pouco, as lanchas vão saindo 
(Às vezes, sabe Deus, para não mais entrar...) 
Que vista admirável! Que lindo! que lindo! 
Içam a vela, quando já têm mar: 
Dá-lhes o Vento e todas, à porfia, 
Lá vão soberbas, sob um céu sem manchas, 
Rosário de velas, que o vento desfia, 
A rezar, a rezar a Ladainha das Lanchas:

Senhora Nagonia!

Olha acolá! 
Que linda vai com seu erro de ortografia... 
Quem me dera ir lá!

Senhora Da guarda!

(Ao leme vai o Mestre Zé da Leonor) 
Parece uma gaivota: aponta-lhe a espingarda 
O caçador!

Senhora d'ajuda! 
Ora pro nobis! 
Caluda! 
Sêmos probes!

Senhor dos ramos 
Istrela do mar! 
Cá bamos!

Parecem Nossa Senhora, a andar.

Senhora da Luz!

Parece o Farol... 

Maim de Jesus!

É tal e qual ela, se lhe dá o Sol!

Senhor dos Passos! 
Sinhora da Ora!

Águias a voar, pelo mar dentro dos espaços 
Parecem ermidas caiadas por fora...

Senhor dos Navegantes! 
Senhor de Matuzinhos!

Os mestres ainda são os mesmos dantes: 
Lá vai o Bernardo da Silva do Mar, 
A mai-los quatro filhinhos, 
Vascos da Gama, que andam a ensaiar...

Senhora dos aflitos! 
Martyr São Sebastião! 
Ouvi os nossos gritos! 
Deus nos leve pela mão! 
Bamos em paz!

Ó lanchas, Deus vos leve pela mão! 
Ide em paz!

Ainda lá vejo o Zé da Clara, os Remelgados, 
O Jéques, o Pardal, na Nam te perdes, 
E das vagas, aos ritmos cadenciados, 
As lanchas vão traçando, à flor das águas verdes, 
"As armas e os varões assinalados..."

Lá sai a derradeira! 
Ainda agarra as que vão na dianteira,.. 
Como ela corre! com que força o Vento a impele:

Bamos com Deus!

Lanchas, ide com Deus! ide e voltai com ele 
Por esse mar de Cristo... 

   Adeus! adeus! adeus!

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"(...) as leis não têm força contra os hábitos da nação; (...) só dos anos pode esperar-se o verdadeiro remédio, não se perdendo um instante em vigiar pela educação pública; porque, para mudar os costumes e os hábitos de uma nação, é necessário formar em certo modo uma nova geração, e inspirar-lhe novos princípios." - José Acúrsio das Neves