sábado, 31 de março de 2012

Regresso ao presente

Se a minha mãe gosta do meu pai, isso está correcto, certo?
Mas se meu pai adora a minha mãe, aquilo está perto?

Tomei a liberdade de dar valor à vida, a de juntar pedaços de tolice com framboesa, a de brincar com compotas - ou seriam geleias de morango?
Esta dúvida que se me assalta assemelha-se de tal forma à prisão em que a alma encarcera o postigo, ¡maldito!, quando, a propósito da música, tento descobrir quem toca uma sonata de Beethoven.
Fujo, meu espírito já ali não está, a única forma de se saber que ali estive, numa cadeira da mesa da cozinha, sem luz mas com reflexos cristalinos de um luar Isabelino, serão as marcas deixadas por mim no meu corpo: a cabeça poisada: "a mão sustenta, em que se apoia o rosto"; " O rosto com que fita".
"Solidão portátil" bem presente naquele homem que me conhece tão bem, três dedos tapam o olho sinistro, os outros dois, destros, sobem a cana do encavalitado nariz aquilino. Pose tipicamente Mafaldesca, ouve pela rádio Brendel interpretar duas sonatas Opus 49 de Beethoven. Que carácter, que nobreza, que vivacidade. Sonatas simples, tempos fluentes. Como é tão bom...
Assim foi (onde estou?), num jardim, (como foi?), perdidos estávamos do tempo (já cheguei?); tomaremos conta do tempo - o tempo que o tempo tem.
Nisto, imprevisível como sempre e doce como nunca, a mulher do meu melhor amigo solta uma risada que nos faz rir e rir e rir e chorar de tanto rir, mesmo aquela amiga comum que dilui o tempo em fórmulas de cianeto, corrompendo a sua alma até dela nada restar que um passo de dança.
- Anda jogar à bola connosco, mesmo com garrafas d'água ou latas de sumos. Vamos lá atingir o Nirvana jogando matrecos sem bola. As leituras que se danem, a primazia deve-se aos amigos.
Que as pautas da vida se reabram, que as melodias se revelem.
Que os pássaros se revoltem.
Que as pessoas se toquem.
Que o rio nos sufoque.
Que a cultura nos provoque.

«Se tudo isto não tivesse acontecido, meus pais não se teriam conhecido.»

E [o Verbo] fez-se carne.

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"(...) as leis não têm força contra os hábitos da nação; (...) só dos anos pode esperar-se o verdadeiro remédio, não se perdendo um instante em vigiar pela educação pública; porque, para mudar os costumes e os hábitos de uma nação, é necessário formar em certo modo uma nova geração, e inspirar-lhe novos princípios." - José Acúrsio das Neves